sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Preços da comida explicam crise

por LUÍS NAVESHoje
A especulação com matérias-primas alimentares disparou aumentos em
2010 e criou as condições para o caos no Egipto.
O colapso financeiro de 2008 teve um efeito poucas vezes mencionado,
mas com grande impacto na crise no Médio Oriente. Segundo peritos da
Organização Mundial da Alimentação (FAO), investidores de Wall Street
que transaccionavam produtos financeiros tóxicos mudaram-se de armas e
bagagens, após o estoiro da bolha imobiliária, para a especulação com
matérias-primas. Esta é a explicação adiantada para o súbito aumento
do preço dos alimentos, fenómeno que também está na origem dos
protestos do Egipto.

Em Janeiro foi batido novo recorde de preços mundiais de alimentos,
pelo sétimo mês consecutivo. O índice de 55 matérias- -primas da FAO
subiu 3,4% face a Novembro, mas, entre Junho e Dezembro, os alimentos
subiram em média um terço. Só o trigo aumentou 70%. Há outros motivos
(custo da energia, secas e cheias), mas não existe um desequilíbrio
entre oferta e procura que explique a alta de preços.
A questão teve importância decisiva na Tunísia, mas também no Egipto,
onde o custo dos alimentos subiu ao longo do ano passado, afectando as
massas mais pobres. No Egipto, 40% da população vivem com menos de
dois dólares diários e o problema do desemprego é gigantesco. A taxa
de desemprego oficial ronda os 10%, mas é enganadora, pois num país de
80 milhões de habitantes apenas 25 milhões são activos, o que deixa
fora das estatísticas pelo menos 20 milhões de pessoas que deviam
estar no mercado laboral. A economia egípcia baseia-se nas receitas do
canal do Suez, turismo, remessas de emigrantes e petróleo e gás
natural. Mas nenhum destes sectores está em expansão suficiente para
minorar a crise.
A agricultura é insuficiente para alimentar uma população em
crescimento demasiado rápido, pois apenas 5% do solo é fértil. Nos
próximos dez anos vão entrar no mercado de trabalho quase 20 milhões
de jovens egípcios e, nos melhores anos da anterior década, a economia
só conseguiu criar postos de trabalho num número anual de meio milhão.
Sem perspectivas de trabalho, vendo a corrupção das elites, a
juventude egípcia pode virar-se para a militância religiosa. E, caso
se prolonguem, os protestos vão afectar ainda mais o país: os turistas
fogem da violência e o canal do Suez corre o risco de ser afectado
(com impacto mundial). Só no corte das telecomunicações durante cinco
dias, o Egipto perdeu 65 milhões de euros.
http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=1775468&seccao=M%E9dio%20Oriente

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