sexta-feira, 15 de julho de 2011

Preço do melão triplica entre o produtor e os hipermercados

Agricultores dizem que os lucros ficam para os intermediários e para
os retalhistas
Devia existir uma linha de distribuição diferente para que não
houvesse um desequilíbrio tão grande de preços desde o produtor ao
consumidor final, defendem os produtores.
José Ferreira, 71 anos, conversa com os seus colegas agricultores
junto aos tractores carregados de melão no Parque do Carril, em
Alpiarça. É o primeiro dia, este ano, que vem vender melão e desconfia
que não vai voltar muitas mais vezes. A venda de melão a
intermediários é escassa e o preço a que está a ser vendido o melão é
um "roubo". José Ferreira é um dos muitos agricultores descontentes
com o actual cenário em que os grandes prejudicados são os pequenos
produtores.

Actualmente o melão está a ser comprado entre 25 a 30 cêntimos o quilo
aos produtores. "É o que nos oferecem e mesmo assim temos dificuldade
em escoar o produto", dizem. Mas se formos às grandes superfícies um
quilo de melão está a ser vendido a 90 cêntimos. "Por isso é que as
grandes superfícies dão lucro e os seus empresários estão cheios de
dinheiro enquanto os pequenos agricultores passam dificuldades",
lamenta Eusébio Branha.
Eusébio Branha, 65 anos, produz melão por conta própria há mais de
quarenta anos, tendo seguido as pisadas do avô e pai. O agricultor diz
que o actual Governo é a "última" alternativa para os pequenos
agricultores. "Se este Governo não nos defender , os pequenos
produtores de melão deixam de produzir. Deixa de haver condições para
trabalhar porque só temos prejuízo. Neste momento não temos uma
organização que defenda quem trabalha", afirma, enquanto os colegas
acenam com a cabeça em sinal de concordância com as suas palavras.

Agricultura não é rentável
Os produtores com quem O MIRANTE falou em Alpiarça discordam do
Presidente da República, Cavaco Silva, que afirma que o "futuro" de
Portugal é voltar à agricultura. Todos concordam que "neste momento" a
agricultura não é rentável nem dá para viver do que a terra pode dar.
Eusébio Branha produziu este ano dois hectares de melão sendo que,
diz, o custo de um hectare de melão por campanha nunca custa menos de
cinco mil euros. Para terem algum lucro teriam que vender todo o
produto a pelo menos 40 cêntimos o quilo de melão.
A mesma opinião tem João Augusto Pedro, de Benfica do Ribatejo
(Almeirim), que produz melões nos campos da lezíria de Vila Franca de
Xira há cerca de duas décadas. O produtor considera que todos têm que
ganhar dinheiro mas considera "inadmissível" que as grandes
superfícies vendam os melões ao triplo do preço a que são comprados
aos produtores. "As pessoas vão ao supermercado e quando vêem o preço
do melão nem compram tanto porque acham demasiado caro. Se vendessem
mais barato escoavam mais produto", refere João Pedro.
O produtor reconhece que tanto os intermediários como os compradores
das grandes superfícies sabem que a agricultura é uma actividade de
"alto risco" e que existe um "timing" para vender os produtos. "Devia
haver uma maior fiscalização por parte do Governo em relação a este
assunto porque há pessoas a ganharem grandes fortunas e são os pobres
que estão a financiar as grandes superfícies, o que é muito injusto",
afirma.
João Augusto Pedro defende que devia existir um associativismo coeso
nesta área "como existe em Espanha". O problema é que as organizações
de produtores em Portugal não funcionam como deviam funcionar. "Não há
solidariedade entre os produtores. Devia existir uma linha de
distribuição diferente para que não houvesse um desequilíbrio tão
grande de preços como existe desde o produtor ao consumidor final.
Temos uma capacidade de produção espectacular, não precisávamos de ir
buscar melões a Espanha como está a acontecer só porque eles os vendem
mais baratos", reflecte o produtor.

Concertação entre distribuidores, produtores e Governo é indispensável
A Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas e do Crédito
Agrícola de Portugal - Confagri afirma que "é indispensável a
concertação entre os grandes distribuidores, os produtores e o governo
para evitar a asfixia do sector" agroalimentar em Portugal. Esse
"entendimento" é "fundamental para salvar a produção agrícola
nacional", sublinha o presidente da Confagri, Manuel dos Santos Gomes.
"Os grande distribuidores" do sector alimentar "importam produtos em
relação aos quais Portugal é auto-suficiente ou mesmo excedentário",
para imporem "baixos preços aos produtores" e manterem para si
"elevadas margens de lucro", critica Manuel dos Santos Gomes.
Nos primeiros cinco meses de 2011, Portugal importou 30 milhões de
litros de leite, embora a produção exceda as necessidades, salienta o
dirigente daquela confederação, que reúne, designadamente, as
federações nacionais de produtores de leite, vinho, olivicultora e
azeite e fruta e hortícolas.
Além da "concertação entre produtores, distribuidores e Ministério da
Agricultura" a Confagri também considera indispensável a existência de
"uma legislação ajustada" e de um regulador para o sector. Mas,
adverte Manuel dos Santos Gomes, "precisamos de um regulador que
regule de facto e não como aquele que temos tido".
"A complexidade da actual situação do país" e as recentes tomadas de
posse do novo governo e da nova direcção da Confagri exigem uma
"discussão séria e alargada do sector e das medidas prioritárias" a
propor ao executivo, sustenta Manuel dos Santos Gomes.
A Confagri está a ouvir as organizações suas associadas para
"identificar os seus problemas e propostas" e também para mobilizar os
agricultores para a "necessidade do país promover o aumento da
produção agroalimentar", acrescenta o presidente da Confederação.
http://semanal.omirante.pt/index.asp?idEdicao=504&id=76076&idSeccao=8247&Action=noticia

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