terça-feira, 3 de janeiro de 2012

A floresta nacional, as celuloses e os "intelectuais do pau"

OPINIÃO

João Dinis

As empresas de celulose e de aglomerados, nas mãos de três ou quatro
grandes grupos económicos e multinacionais, estão de novo, em toda a
linha, a pressionar a fileira florestal, os governantes e a opinião
pública.
Dizem até (ou chantageiam?) que têm recursos financeiros para investir
em Portugal mas que, tal como estão as coisas na fileira florestal,
não podem investir cá e terão que ir investir para fora do País…
O maior pretexto para uma tal pressão é, pois, o da alegada falta de
matéria prima para se abastecerem no mercado nacional, pelo que estão
a ser "forçadas" a importar madeira, dizem-nos.

Por coincidência - ou não será por coincidência ? - aí temos um
numeroso coro de pressurosos "intelectuais do pau" a teorizarem sobre
os males da nossa Floresta e a coincidirem - ou não será pura
coincidência ? - numa das principais "teses" das celuloses: - segundo
eles, a maior culpa pela situação, de facto muito preocupante da
Floresta Nacional, recai sobre a "pulverização" da propriedade
rústico-florestal. Portanto, concluem, é preciso "re-estruturar" a
propriedade ou seja, é necessário " re-estruturar" centenas de milhar
de pequenos e médios proprietários/produtores florestais, e até será
necessário "re-estruturar", enfim, a propriedade comunitária dos
Baldios os quais, por sinal, até dispõem de áreas florestais grandes.
Isto até parece já uma "teoria" para dar cobertura a uma espécie de
"solução final" (eliminação…) para umas centenas de milhar de pequenas
parcelas florestais…
Bem, mas antes de prosseguir, devo explicar por que razão me lembrei
de apelidar esses "teóricos" da Floresta de "intelectuais do pau": - é
que na essência das suas conjecturas - e alguns deles são pessoas com
grandes responsabilidades perante o que de mau aconteceu e acontece na
nossa Floresta - na essência das suas conjecturas, dizia, tendem para
apoiar (talvez por desinformação de muitos deles) a produção
industrial intensiva, monocultural, de espécies florestais de
crescimento rápido.
Ora, em Portugal e no mundo, produzir madeira não é a mesma coisa que
produzir "pau" ( e esta paga direitos de autor…).
Sim, produzir madeira não é a mesma coisa que produzir "varas" de
eucalipto e mesmo de pinheiro. "Varas" que da mata seguem para serem
estilhaçadas, trituradas, submergidas e cozidas em colas, vernizes e
ácidos nas celuloses e nas fábricas de aglomerados !
Mas, afinal, será que a excessiva concentração da
propriedade/exploração florestal em áreas enormíssimas nas mãos de
grandes proprietários/produtores - como acontece no eucalipto e no
sobreiro - será que essa muito grande concentração da propriedade não
é um problema sócio-económico e ambiental ainda maior que o da
pulverização da propriedade?
A elevada concentração da propriedade/produção florestal, por exemplo
na mão das celuloses, permite controlar a fileira e impor baixos
preços da madeira aos pequenos e médios Produtores Florestais. E no
Sobreiro (cortiça) é a mesma coisa.
Por outro lado, as monoculturas intensivas são sempre prejudiciais ao
ambiente e à Natureza (biodiversidade). E deve ser por isso mesmo que,
na recente e pretensamente "verde" proposta de reforma da PAC, a
Comissão Europeia está a abrir a possibilidade de, pela primeira vez,
subsidiar o investimento em espécies florestais de crescimento rápido…
Precisamos de melhores preços à Produção e de outras e mais sérias
políticas (agro)Florestais
Acontece que o factor por excelência estruturante é o preço à Produção
e isso também é válido para a produção florestal.
A nossa madeira, na mata e fora desta, está a preços baixos desde há
já muito tempo. Aliás, há demasiado tempo para que assim continue
também porque, em tais condições, nem um "milagre" poderá resolver o
imbróglio da chamada "gestão activa" da Floresta.
Ora, uma vez que as celuloses estão "cheias" de recursos financeiros,
então por que razão não pagam mais pela madeira à Produção ? Pagando
melhor pela madeira, logo aumentaria bastante a produção mesmo com a
tal "pulverização" da propriedade. Aliás, já foi isso mesmo que
aconteceu há vinte / trinta anos atrás quando o "novo" eucaliptal se
"apropriou" de vastíssimas áreas onde até aí havia pinhal… O problema
é que as celuloses e outras grandes empresas da fileira estão é
interessadas em obter a matéria prima ao mais baixo preço seja em
Portugal seja em África ou Brasil ou China.
A Floresta Nacional continua desprotegida e desordenada. Órfã de
políticas públicas eficazes.
Com o PRODER ausente da produção florestal. Com as "famosas" ZIF a
patinar - as ZIF foram uma "invenção" que, por assim dizer, já
"ardeu"...
Com o actual governo ( que tende para se submeter aos grandes
interesses e outros "lobys" que cobiçam a Floresta ) apenas a ameaçar
com a eventual penalização fiscal - que será inconstitucional - dos
proprietários que não cuidem da suas parcelas agro-florestais e de uma
forma tal que mais será uma "expropriação" de facto.
Entretanto, uma série de pragas e doenças está dizimar a Floresta a um
ritmo hoje mais "sistemático" do que o dos próprios incêndios
florestais.
Neste contexto, e durante todo o ano de 2011 -- Ano Internacional da
Floresta -- a CNA tem vindo a propor e a reclamar aos Governos e a
outros Órgãos de Soberania a definição urgente de um Plano Nacional de
Emergência para dar combate eficaz às doenças e pragas da Floresta ( e
não apenas ao Nemátodo). Mas oficialmente "assobia-se para o lado" e
apenas se diz que não há verba…
Então e o "Fundo Florestal Permanente" para onde todos os dias estamos
a contribuir através da taxa incluída no custo dos combustíveis ?...
E que se passa quanto a um semi-clandestino "fundo florestal atlântico" ?...
Aliás, no caso do combate ao Nemátodo, há grandes atrasos nos
pagamentos de compromissos do Estado para com várias Entidades. Também
por isso, pode dizer-se que o combate ao Nemátodo está a ser
negligenciado e com pesadas consequências.
Pois bem, se não há verba para dar combate sistemático e eficaz às
pragas e doenças da Floresta pois que se arranje essa verba e o mais
depressa possível enquanto ainda houver Floresta que mereça a pena !
Antes que áreas enormes passem a ser "cemitérios de pau podre"…
João Dinis
http://www.agroportal.pt/a/2012/jdinis.htm

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