terça-feira, 22 de maio de 2012

Hortas urbanas. Descobrir a agricultura de auto-subsistência em tempos de crise

Por Nelson Pereira, publicado em 22 Maio 2012 - 03:10 | Actualizado há
7 horas 40 minutos
Além de serem espaços verdes sustentáveis a baixo custo, asseguram um
suplemento ao orçamento familiar

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A migração rural para as cidades deu origem ao aparecimento de hortas
improvisadas nos arrabaldes. Nos anos 80, o arquitecto paisagista
Gonçalo Ribeiro Telles chamou a atenção para a importância destas
hortas, consciente daquilo que se fazia no Norte da Europa. As
autarquias começaram a perceber que as hortas comunitárias representam
um valor na requalificação dos espaços urbanos, promovendo a
eco-sustentabilidade e uma agricultura de auto-subsistência e
contribuindo para projectos de inclusão social.


Hortas urbanas são um fenómeno com longa história nos EUA e no Norte
da Europa, é recente em Portugal. Além de constituírem uma excelente
ocupação de tempos livres e alívio do stresse, têm, com a crise, um
papel importante no orçamento familiar, como suporte à subsistência.

Inicialmente ligadas a projectos municipais, as hortas urbanas
escapam-se cada vez mais a esta fórmula e começam a surgir no âmbito
de iniciativas privadas. É o caso das hortas comunitárias da Fábrica
de Braço de Prata (FBP), 25 talhões que estão a ser cultivados nos
terrenos da antiga fábrica de munições, numa parceria entre a FBP, que
cede o terreno, e a Biosite, cooperativa sem fins lucrativos que
concebeu e faz a gestão do projecto em conjunto com os hortelões.
"Trata-se de uma evolução natural. Foi importante o contributo das
câmaras para a estruturação do cultivo desordenado, mas, cada vez
mais, os proprietários de terrenos não utilizados estão interessados
em cedê-los para cultivo", disse ao i Raquel Luz Sousa, especialista
formadora em agricultura biológica e responsável da Biosite.

A condição para participar neste projecto comunitário é respeitar um
regulamento que consagra, entre outros pontos, a ausência de práticas
agrícolas com químicos. A formação está a cargo da Biosite, que
organiza cursos mensais para grupos de 10 a 20 pessoas, nos quais cada
candidato a hortelão aprende as bases e a metodologia de produção da
agricultura biológica. O projecto é auto-financiado, existindo um
fundo de maneio comunitário do qual é paga a água e as despesas de
manutenção. Além de oferecer cursos e workshops à população e
consultoria a projectos deste tipo, a Biosite assegura assistência
técnica a este projecto e tem um serviço de distribuição de cabazes de
legumes e fruta ao domicílio.

Enquanto nos projectos municipais se disponibilizam terrenos aos
candidatos a hortelões com base no rendimento do agregado familiar,
que provêm de faixas sociais mais carenciadas, projectos privados como
o da FBP são mais transversais. "Temos pessoas de todas as idades e
classes sociais. Há quem venha com crianças, há quem cultive o talhão
a meias com amigos", explica Raquel Sousa. "Enquanto nos espaços
municipais só entram os hortelões, aqui estamos mais próximos do
conceito dos jardins comunitários, integrados no projecto cultural da
FBP, cujo público usufrui livremente do espaço", acrescenta.

A agricultura biológica usa de uma metodologia própria para resolver
problemas como infestantes e pragas: a consociação de plantas. Em vez
de um tipo único de planta, um canteiro de 1 m2 tem pelo menos cinco
culturas diferentes, que podem ser tomates, alfaces, pepinos, cebola e
beterrabas, por exemplo. Quanto à produção, "usando da metodologia
apropriada, podemos conseguir anualmente, num talhão de 25 m2, 300 kg
de produtos hortícolas", afirma Raquel Sousa.

As hortas urbanas existem já um pouco por todo o país. Um dos exemplos
de maior envergadura é o "Horta-à-porta" no Porto, onde, em terrenos
cedidos pela Lipor, a empresa intermunicipal de tratamento de
resíduos, funcionam 17 áreas de hortas, contando a lista de espera
mais de 1900 pessoas. Entre outros destacam--se ainda projectos na
Alta de Lisboa, financiado pela Gulbenkian, no Instituto Politécnico
de Coimbra, na Universidade do Minho, no Funchal, em Lagos ou em
Odivelas. De talhões a varandas, parapeitos, terraços e pátios,
qualquer pequeno canteiro pode dar-nos o prazer de criar alfaces,
tomates ou ervas aromáticas.

http://www.ionline.pt/portugal/hortas-urbanas-descobrir-agricultura-auto-subsistencia-tempos-crise

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