segunda-feira, 23 de julho de 2012

As aparências iludem: os tomates já não são o que eram

Ciência

Os tomates são cada vez mais bonitos e perfeitos mas perderam o sabor.
SAIBA PORQUÊ
Por Sara Sá
11:00 Segunda, 23 de Julho de 2012


"Os olhos também comem." Quanto a isto não restam dúvidas. Mas esta
máxima está a custar-nos o que verdadeiramente conta no prazer da
mesa: o sabor. Os tomates são o exemplo perfeito de como da busca de
um fruto bonitinho, sem manchas, acabou por resultar uma experiência
pobre e dececionante, na hora de mastigar. Há mais de 70 anos que os
produtores de tomate selecionam as variedades mais vermelhas e de cor
homogénea. Décadas de cruzamentos entre sementes originaram um tomate
de aspeto perfeito, que enche as prateleiras dos supermercados
americanos, europeus e asiáticos. Bonitos por fora, mas
desinteressantes por dentro.

Nas plantas, a fotossíntese permite produzir glicose, através da luz
solar e da água. Este processo acontece numas pequenas estruturas, os
cloroplastos, onde está a clorofila, a qual dá a cor às plantas.
"Quando se selecionam tomates com cor mais uniforme, diminui-se a
quantidade de cloroplastos e, logo, de glicose", esclarece Cândido
Pinto Ricardo, 75 anos, coordenador do grupo de bioquímica de plantas
do Instituto de Tecnologia Química e Biológica, em Oeiras. "Ficámos
com menos cores e menos aroma."

O gene responsável
O assunto é tão sério que levou uma equipa de cientistas da
Universidade da Califórnia - região líder mundial na produção destes
frutos -, a analisar dezenas de variedades de tomates da América, da
Ásia e da Europa. Em todas elas, encontraram uma mutação genética que
reduz a quantidade de açúcar. Um único gene, o SIGLK2, faz a diferença
entre o saboroso tomate selvagem e o "plastificado" que encontramos
nas grandes superfícies comerciais. "O SIGLK2 regula a formação de
cloroplastos. Uma forte concentração de cloroplastos num tomate leva a
uma grande variedade de verde, que é a característica que os
produtores tentam evitar. A questão é que também aumentam os níveis de
açúcar no tomate, e os açúcares desempenham um papel essencial na
formação do sabor", lê-se num artigo publicado esta semana na revista
Science.

"É igualmente importante o estado em que se apanham os frutos", nota
Pinto Ricardo. A opção dos produtores passa por colher os tomates
ainda verdes, para que resistam às viagens até ao destino final e a
vários dias na prateleira do supermercado. Só que este amadurecimento
fora da terra também se paga em sabor. "Para amadurecer como deve ser,
o tomate precisa de estar exposto ao vento, ao sol intenso - e tudo
isto contribui para o enriquecer", explica.

Em laboratório, a equipa de cientistas conseguiu corrigir a alteração
genética e repor o sabor do estado selvagem. O resultado é um tomate
com mais 40% de açúcar. Um valor medido, mas nunca saboreado, já que
se trata de um organismo geneticamente modificado - a legislação
impede o seu consumo, até ser certificado.

Agricultura: Um bom negócio
Rico em nutrientes e com propriedades antioxidantes associadas ao
licopeno, o tomate não faz apenas bem à saúde: é também um dos frutos
mais apreciados em todo o mundo, produzindo-se mais de 120 mil
toneladas por ano. Portugal tem "excelentes condições" para se
destacar no mercado mundial, assegura Gonçalo Escudeiro, 42 anos,
diretor da Torriba, Organização de Produtores de Hortofrutícolas.
"Conseguimos colher, todas as semanas do ano, graças ao nosso verão
ameno, com noites frescas e a uma ótima qualidade do solo", sublinha.
Em 2010, o setor valia 250 milhões de euros e 95% da produção tinha
como destino o mercado externo.



http://visao.sapo.pt/as-aparencias-iludem-os-tomates-ja-nao-sao-o-que-eram=f676809

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