quarta-feira, 8 de agosto de 2012

AR: PCP questiona Governo sobre o «escândalo do controlo da qualidade e segurança alimentar»

O Deputado do PCP Agostinho Lopes entregou na Assembleia da República
uma Pergunta em que solicita ao Governo que lhe sejam prestados
esclarecimentos sobre o «escândalo do controlo da qualidade e
segurança alimentar – consequência da obsessão pelo défice orçamental
e imposições do Pacto de Estabilidade e Pacto de Agressão-Troika»,
Pergunta que se passa a transcrever.

Destinatários: Ministro de Estado e das Finanças, Ministro da Economia
e do Emprego e Ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do
Ordenamento do Território

PERGUNTA:

1. No dia 29 de Julho surgiu na comunicação social (Jornal de
Notícias, página 33) uma notícia, com origem não identificada na ASAE,
que sob o título "Ninguém fiscaliza carne, ovos e peixe que comemos",
denunciava um preocupante funcionamento de serviços do Estado.
A notícia é desenvolvida, assinalando-se que "carne, mel, leite, ovos
e peixe de aquacultura que comemos estão sem qualquer tipo de
fiscalização".
Cita igualmente a opinião da DECO, que fala em "grave
perigo para a saúde pública" e da Associação Portuguesa do Direito ao
Consumo (APDC) que "exige explicações da Ministra da Agricultura".
A notícia localiza o problema na não colheita de amostras, que era
feita pela ASAE. Esta entidade, não o fez em Janeiro e Fevereiro,
fê-lo em Março, e deixou de o fazer a partir desse mês, em contradição
com o habitual e feito durante 2011. Supostamente, essas recolhas ou
alguma dessas recolhas de amostras, teriam passado a ser feitas pela
Direcção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), que teria deixado
de as solicitar à ASAE, para as fazer por meios próprios. A ASAE terá
continuado a fazer a recolha nos pontos de venda.
Questionado pelos Órgãos de Comunicação Social sobre a situação, o
Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território
(MAMAOT), limitou-se a fornecer dados de 2011, não os de 2012, e não
desmentindo "que se esteja neste momento sem qualquer controlo"!
Segundo o Jornal de Notícias (JN), "Para além de contactar o gabinete
da ministra da Agricultura, que se furtou a comentar a atual falta de
fiscalização, o JN tentou insistentemente obter reações do ministro
Álvaro Santos Pereira (é o ministério da Economia que tutela a ASAE),
secretário de Estado da Agricultura, DGAV e ASAE, mas ninguém se
dignou responder".
2. O que se seguiu à notícia do JN de 29 de Julho nos dias seguintes,
foi uma espantosa cacofonia de diversas entidades, DGAV, ASAE, Ordem
dos Médicos Veterinários, e do próprio Ministério da Agricultura.
Declarações e informações, contraditórias e ambíguas, imprecisas e
parcelares, metendo autenticamente os pés pelas mãos, sem nunca se
assumir um esclarecimento unívoco e rigoroso, sobre matéria de extrema
sensibilidade na opinião pública e possíveis consequências graves nas
actividades produtivas (agricultura, pescas, indústria agroalimentar),
nomeadamente em matéria de exportações. (Bastará recordarmo-nos do
acontecido com as "vacas loucas", os "nitrofuranos" ou bem
recentemente com os "pepinos contaminados"!)
O que se fez, foi tentar justificar de forma atabalhoada a situação
denunciada, com declarações para a opinião pública, pretensamente
tranquilizadoras mas vazias de conteúdo, na matéria crucial da
segurança alimentar. Invocou-se uma "racionalização de recursos"
humanos, referindo-se os matadouros, onde, a recolha da ASAE teria
sido substituída por inspectores técnicos da DGAV! Segundo a DGAV,
teriam sido recolhidas 2 470 amostras, 1650 pela própria DGAV e 820
pela ASAE (JN de 31 de Julho), isto é, no 1º semestre, cerca de um
terço das previstas no plano anual (7500 colheitas).
E para a confusão ser total, o Director da DGAV, tenta a justificação
canhestra, argumentando não valer a pena fazer as recolhas aprazadas,
porque nem sempre há/houve "uma resposta útil" por parte dos
laboratórios. Levantando, assim um novo e gravíssimo problema: o do
funcionamento dos laboratórios oficiais que deviam analisar as
amostras recolhidas! Na mesma linha de pseudojustificação e de
desresponsabilização do Estado, é a desvalorização do controlo oficial
e por entidades públicas, pela "monitorização do autocontrolo
desenvolvida pelos próprios operadores" ou de que a segurança dos
produtos alimentares de origem animal "está salvaguardada através dos
múltiplos controlos" (Comunicado enviado às redacções dos OCS pelo
ministério da Agricultura), ou de que controlo "é agora assegurado por
outros serviços" (?!), segundo a Bastonária da Ordem dos Médicos
Veterinários (Diário de Noticias de 31 de Julho).
E quanto mais os OCS aprofundavam a investigação, nomeadamente ouvindo
entidades não oficiais, como a Federação de Sindicatos da Função
Pública, mais se enterravam o Governo e os Departamentos da
Administração Central ligados ao problema.
Descobriu-se que o Laboratório Nacional de Investigação Veterinária
(LNIV) da tutela do Ministério da Agricultura, não fazia as análises
das amostras por falta de verbas para os reagentes – teria gasto no 1º
Trimestre o orçamentado para todo o ano de 2012, tendo ainda a haver
um dívida de três anos de serviços de análise prestados à ex-DGV, hoje
DGAV…Descobriu-se que muitas das amostras colhidas pela ASAE em anos
anteriores não teriam chegado a ser analisadas, em tempo adequado, e
foram deitadas ao lixo! Segundo um Relatório de auditoria feito pelo
Serviço Alimentar e Veterinário da Comissão Europeia, publicado há um
mês, "cerca de 2600 das 8000 amostras" enviadas ao LNIV em 2010 " não
tinham sido analisadas em Março de 2011". Algumas amostras de Janeiro
de 2010, só foram analisadas em Outubro ou Novembro de 2011, ou seja
quase dois anos depois, lê-se no mesmo Relatório. Segundo o Serviço
Europeu, o Programa Nacional de Pesquisa de Resíduos não tinha sido
cumprido, contrariamente ao afirmado pela ex-DGV!
Descobriu-se (ainda segundo o comunicado do Ministério da Agricultura
ás redacções dos OCS) que «"temporariamente" as amostras estão a ser
enviadas para um laboratório acreditado e situado no espaço europeu»
(!?) (Público de 31 de Julho). Isto é, atingiu-se o absurdo ou um pico
de desorientação total: não há dinheiro para que o LNIV faça as
análises, mas há dinheiro para o fazer no estrangeiro, provavelmente
com mão-de-obra técnica especializada e emigrada do País…
3. A ministra da Agricultura ouvida em sede da Comissão de Agricultura
e Mar/Assembleia da República na passada 2ª feira, 30 de Julho, foi
questionada por Grupos Parlamentares, entre os quais o GP do PCP,
sobre o assunto.
Não se limitou a repetir afirmações "tranquilizadoras" e frases feitas
sobre a garantia da segurança alimentar, mas incapazes de real
esclarecimento. Assumiu mesmo a já referida e espantosa "teoria", da
insuficiente resposta dos laboratórios oficiais, como (aparentemente)
razão para não se fazerem as colheitas de amostras previstas nos
planos de controlo! Como depois acrescenta, que o plano de colheitas
se fará até ao fim do ano, em total desconhecimento das normas da
regular amostragem ao longo do ano! Também, não esclareceu, apesar de
solicitada pelo GP do PCP, a razão para não ter havido em assunto de
tanto melindre, resposta adequada às solicitações dos OCS!
Apetece escrever, o filme é mau de mais, para ser verdadeiro!
Atropelando-se, violando-se tudo o que legalmente está estabelecido em
matéria de controlo de segurança alimentar, atamancam-se desculpas
esfarrapadas, criando-se na opinião pública e na produção, um
sobressalto maior, do que aconteceria com a assumpção clara dos erros
e falhas e um anúncio rigoroso de que seriam tomadas as medidas
adequadas: na colheita das amostras, nas análises e nos laboratórios
oficiais, no esclarecimento da opinião pública!
A tudo isto se acrescenta a informação (DN de 31 de Julho) de que
centenas de multas, resultantes da intervenção da ASAE, estão a
prescrever ou já prescritas, porque a Comissão de Aplicação de Coimas
em Matéria Económica e Publicidade (CACMEP) não tem pessoal para as
cobrar. De 25 funcionários terá hoje 18, a que se somará a falta de
orientações do actual Governo. Situação que terá determinado o seu
Director, a pedir a aposentação, instabilizando ainda mais a Comissão.
Para lá da não concretização do papel penalizador e dissuasor da
coima, está-se a falar da perda de receitas do Estado da ordem de
milhões de euros!
4 .Os problemas existentes em matéria do processo público de
acompanhamento da segurança alimentar, e que agora ganhou forte
visibilidade mediática, não começaram com este Governo PSD/CDS. É o
resultado de uma política de desmantelamento do aparelho de Estado,
visando a privatização de importantes serviços de controlo e
fiscalização. O que há muito está em curso no ministério da
agricultura e pescas a no ministério da economia, através da brutal
redução de recursos humanos (ver com Governos PS/Sócrates o SME e
agora o Governo PSD/CDS, o PREMAC, e com ambos a contratualização de
serviços a privados), o estrangulamento financeiro dos orçamentos de
funcionamento e a destruição de estruturas técnicoadministrativas.
Destacam-se nestas políticas as "reestruturações" e o desinvestimento
nos laboratórios e outras unidades de I&D do Estado.
O actual Governo PSD/CDS, dá total continuidade ás anteriores
políticas, em nome da redução da despesa pública, com a "expulsão" de
centenas de técnicos e especialistas (nem é preciso despedir,
reformam-se! as pessoas estão cansadas, fartas, de se verem atingidas
no seu brio técnico e profissional e de falta de respeito por dezenas
de anos de dedicação á causa pública), ainda mais restrições
orçamentais e reestruturações de departamento e serviços, sem outro
sentido que não seja poupar (?!) uns euros!
Os resultados estão à vista! Os riscos são imensos. Para a saúde
pública. Para as actividades económicas. Para as próprias receitas do
Estado. Tudo em nome do combate ao défice orçamental e do estrito
cumprimento das imposições do Pacto de Agressão da Troika. 5.Mas,
algumas questões precisam de ser rapidamente esclarecidas e bem
esclarecidas pelo Governo, Ministra da Agricultura e Ministro da
Economia no quadro das suas obrigações no âmbito do Plano Nacional de
Controlo Plurianual Integrado (PNCPI), que vigente no período
2009/2011, não foi que se saiba alterado e revisto, com é possível
constatar no sítio electrónico do Ministério da Agricultura.
PNCI (decorrente do Regulamento (CE) nº 8882/2004 do PE e do Conselho
de 29 de Abril (e subsequentes alterações) e da legislação nacional
que o enquadra) que engloba "um conjunto de planos específicos de
controlo (36 ao todo), tendo como objectivo assegurar que o controlo
oficial cobre toda a legislação alimentar e todos os géneros
alimentícios ao longo de toda a cadeia alimentar (…)".
Na situação agora detectada e denunciada publicamente, destacam-se
problemas que devem ser completamente clarificados, nomeadamente:
- A organização e operacionalização da colheita de amostras;
- A análise laboratorial das amostras e o funcionamento dos
Laboratórios Nacionais;
- O cumprimento dos planos e programas de controlo do PNPCI;
- Os departamentos e serviços de Estado que, (independentemente das
devidas articulações entre si) tutelam e operacionalizam cada
controlo, ou plano de controlo;
- A aplicação de sanções e coimas por violação do quadro legal
estabelecido na matéria.
A que se deverá acrescentar, a necessidade do esclarecimento do
Governo, às diversas questões que foram sendo levantadas pela
Comunicação Social!
Ao abrigo das disposições legais e regimentais em vigor, solicito ao
Governo que, através dos ministros a quem são dirigidas as Perguntas
me preste os seguintes esclarecimentos:

A) Sobre a colheita de amostras
Segundo o PNPCI e a própria ASAE, é competência desta, o Plano
Nacional de Colheita de Amostras (PNCA). Segundo a ASAE, "este Plano
cuja gestão cabe por inteiro à ASAE/GTP, destina-se a
verificar/salvaguardar que os géneros alimentícios existentes no
mercado não colocam em risco a segurança e saúde humana".
1. Quando e quem (que órgão do ministério da Agricultura) decidiu
alterar os agentes de colheitas de amostras, substituindo técnicos da
ASAE por técnicos da DGAV? Mas como é isso feito, se a tutela e gestão
do PNCA é da competência exclusiva da ASAE, dependente e sob a tutela
do ministério da Economia? Solicitava o envio de documento oficial,
"despacho", "circular", "ordem de serviço", ou outro, em que se
formalizou tal decisão.
2. Quando e como a DGAV assumiu a competência directa pelo PNCA? Qual
foi a opinião (se foi consultado) do Comité de Acompanhamento do
Controlo Oficial (CACO), a quem cabe acompanhar a execução do PNPCI?
3. Qual a divisão das colheitas entre a ASAE e a DGAV, relativamente
aos pontos da cadeia alimentar onde habitualmente eram feitas?
4. Porque não foram colhidas amostras em Janeiro e Fevereiro, nem pela
ASAE nem pela DGAV? Se foram, quantas amostras foram colhidas?
5. Onde (pontos de colheita na cadeia alimentar), quem (que técnicos
da DGAV) e quando foram feitas as cerca de 1650 colheitas que a DGAV
diz ter efectuado entre Abril e Julho de 2012? Solicitava os
relatórios correspondentes a essas colheitas.
6. Qual foi em 2010 e em 2011, o ritmo mensal das colheitas efectuadas
pela ASAE – solicitava uma informação sobre o nº de amostras colhidas
por mês?
7. No quadro da reestruturação orgânica do MAMAOT, quando estará
reformulado e revisto o PNPCI para um novo período temporal?
8. Em 2007 foram transferidos da então DGV vários técnicos para a
ASAE/Ministério da Economia. Qual é hoje o nº de inspectores técnicos
da DGAV e qual a sua distribuição geográfica?
B) A análise das amostras e a situação dos laboratórios nacionais de referência
O PNPCI estabelece que o Instituto Nacional de Recursos Biológicos, IP
(INRB,IP) é o resultado "de uma holding de três grandes Laboratórios:
o Instituto Nacional de Investigação Agrária (LINIA), o Instituto de
Investigação das Pescas e do Mar (L-IPIMAR) e o Laboratório Nacional
de Investigação Veterinária (L-NIV), considerados para o efeito,
laboratórios de referência.
1. Quantas amostras foram enviadas para o estrangeiro? Desde que data
e até quando se prevê que tal aconteça? Quais os laboratórios
estrangeiros no espaço europeu, que receberam essa incumbência do
Estado Português? Quais os custos previstos com essas operações? Qual
o resultado dessas análises? Qual o custo médio dessas análises
comparados com os custos médios dos laboratórios nacionais?
2. Quais foram os laboratórios nacionais que não responderam às
solicitações da ASAE e da DGAV? Quais os que acabaram por deitar fora
as amostras, por falta de análise em tempo adequado? Qual a razão da
"impotência" desses laboratórios? Insuficiência financeira? Escassos
recursos humanos?
3. Qual o valor da dívida da ex-DGV e actual DGAV e outras estruturas
públicas aos referidos laboratórios? Solicitava lista das dívidas por
laboratório.
4. Quais os laboratórios nacionais, ou quais dos seus
departamentos/UIDT – Unidades de Investigação e Desenvolvimento
Tecnológico, não estão devidamente certificados e acreditados? Porquê?
Quais os que estão?
5. Que avaliação fazem o MAMAOT e o MEE (LSA/Laboratório de Segurança
Alimentar da ASAE, e outros) dos meios – recursos humanos e dotações
financeiras – dos laboratórios nacionais, para responderem às missões
que oficial e legalmente lhes estão atribuídas?
C) Cumprimento do Plano Nacional de Controlo de Resíduos de Pesticidas
(PNCRP) e do Plano Nacional de Pesquisa de Resíduos (PNPR)
1. Solicitava uma informação sobre o nº de colheitas de amostras
ligadas com o PNCRP ao longo de 2011 e o nº de amostras colhidas em
2012? Onde foram analisadas essas amostras? Quais os resultados?
2. Uma informação semelhante, referente ao PNPR?
D) Cumprimento dos Planos de Controlo da Importação de Géneros
Alimentícios, de origem animal e origem não animal
1. Qual o nº de amostras colhidas em 2011 e no 1º semestre de 2012?
Que géneros e grupos de alimentos/bebidas foram abordados? Onde foram
feitas as análises? Quais os resultados?
E) Informação sobre processos contraordenacionais e coimas aplicadas,
resultantes do controlo ao abrigo do PNPCI
1. Qual o valor das coimas aplicadas e das coimas cobradas em 2011?
Qual o nº de coimas de
2011 prescritas?
2. Uma informação semelhante respeitante ao 1º Semestre de 2012?
3. Que medidas estão em curso para reforçar a capacidade e eficiência da CACMEP?
F) Esclarecimento da opinião pública
Qual a razão dos ministros da Agricultura e da Economia não terem
procedido a um esclarecimento suficiente, desenvolvido e rigoroso da
opinião pública, nomeadamente na resposta rigorosa às perguntas dos
OCS?
Palácio de São Bento, sexta-feira, 3 de Agosto de 2012

Deputado(a)s

AGOSTINHO LOPES (PCP)

Fonte: Grupo Parlamentar do PCP

http://www.agroportal.pt/x/agronoticias/2012/08/07h.htm

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