domingo, 9 de setembro de 2012

“A marca “Flores do Montijo” vai promover o nome do concelho”

Vítor Araújo, vice-presidente da APPPFN e gerente da Florineve



"Para levar mais longe o nome do concelho e o sector da floricultura",
os produtores de flores do Montijo preparam a apresentação da marca
"Flores do Montijo", que "vai servir para ganhar escala numa
perspetiva de complementaridade" e que "poderá fazer parte de um
roteiro de oferta turística", uma vez que esta é "a principal região
produtora de flor de corte de Portugal". O vice-presidente da
Associação Portuguesa de Produtores de Plantas e Flores Naturais
(APPPFN) e gerente da Florineve explica que "o Montijo possui um micro
clima favorável a este tipo de cultivo", mas admite que "é necessário
divulgação" do sector. Vítor Araújo, em entrevista ao "Setúbal na
Rede", reconhece que a APPPFN "não tem mais força porque há um
espirito muito individualista" e considera que, "enquanto as pessoas
preferirem agir individualmente, é muito complicado" ganhar escala e
ser reivindicativo junto do Governo.

"Setúbal na Rede" – Como é que a floricultura pode contribuir para o
turismo no Montijo?

Vítor Araújo - Principalmente dando a conhecer que o Montijo é a
principal região produtora de flor de corte de Portugal, já que
produzir entre 70 a 75 por cento da flor que se produz no nosso país
confere-nos um certo mérito. A família Gonçalves foi a pioneira na
produção de flores porque descobriram que o Montijo possui um micro
clima favorável a este tipo de cultivo. Há mais de 30 anos que essa
família se iniciou cá e ainda hoje os irmãos fazem parte das maiores
empresas de produção de flores. Foi onde estagiei e onde adquiri os
conhecimentos que hoje aplico na minha empresa. O nosso clima tem
condições que favorecem a produção da flor, porque no Inverno não
precisamos de tanto aquecimento e no Verão não costumamos passar
grandes problemas, porque se trata de um clima mais ameno,
conferindo-nos uma certa mais-valia na produção de flores de corte.

SR – E as flores que se consomem em Portugal são hoje maioritariamente
desta região?

VA - No passado, a maior parte das flores comercializadas no nosso
país vinha da Holanda, mas de há uns anos para cá aumentámos o fluxo
de produção, até porque Portugal tem melhores condições climáticas do
que a Holanda. Temos tirado partido deste clima para produzir tão bem
ou melhor do que os holandeses, adquirimos a técnica que eles utilizam
e adaptámo-la ao nosso clima, e isso tem permitido substituir grande
parte das importações por flores produzidas dentro do país.

SR – Mas no imaginário das pessoas, as flores continuam a estar
associadas à Holanda.

VA – As pessoas ainda continuam a pensar isso, mas poderíamos tirar
partido desse mito que em Portugal se faz tão bem ou melhor do que no
estrangeiro. No entanto, para isso acontecer é necessário divulgação e
nessa área há uma falha muito grande e é também por isso que uma das
missões da AFFFPN é apostar nas relações externas do sector. Fazemos
pequenas ações de sensibilização, participamos em feiras e
patrocinamos alguns eventos para tentar dar destaque ao nosso sector,
mas é um trabalho gradual que não nos permite apresentar resultados de
forma rápida.

SR - Qual o peso do sector a nível nacional?

VA - Segundo estudos que são apresentados, em termos económicos temos
um peso 50 por cento superior ao que o azeite tem, que é um produto
prestigiado e resultado também do tipo de clima que nós temos. Temos
ainda um grande potencial de crescimento, uma vez que se continua a
importar, embora cada vez menos. Na minha opinião, enquanto se
importar significa que há uma lacuna no mercado e o nosso objetivo é
substituir essas importações por flores produzidas em Portugal.
Posteriormente há ainda uma grande fatia de mercado que temos de
conquistar através da exportação e tem de ser essa a linha que devemos
seguir. No entanto, a conjuntura económica atual não é a ideal, por
isso estamos numa fase de manter o que temos e esperar que a economia
dê sinal e aí conseguirmos comercializar para fora de Portugal.

Nos últimos tempos nota-se um decréscimo nas vendas, especialmente
depois do aumento do IVA para a taxa máxima, que surgiu como um travão
para o desenvolvimento. Ficou mais difícil para o nosso sector e é
algo que temos de ultrapassar, mas apertamos as margens de lucro para
tentar vender a mesma quantidade de flores com menor lucro, até porque
as famílias têm menos dinheiro e como as flores são uma coisa
supérflua, é normal que haja uma retração.

SR - Como podemos caracterizar este sector?

VA - Depende da capacidade dos gestores das empresas produtoras,
porque há algumas que, com alguma ginástica financeira e imaginação,
conseguem superar, mas existem outras que estão com dificuldades. No
país temos vários associados a passar graves dificuldades.

SR – O que distingue a produção nacional de flores da produção holandesa?

VA - O problema da produção nacional é que não consegue manter uma
qualidade constante. Os holandeses fazem um controlo de qualidade
rigoroso e um produtor é um produtor, não um comerciante. As suas
flores passam por um crivo para ser atribuída uma classificação e com
base nisso entram no mercado e o preço de venda depende da qualidade
das flores. Em Portugal, as empresas são simultaneamente produtoras e
comerciantes e às vezes é difícil que as regras de qualidade se
mantenham elevadas. Isso acontece quando há uma praga, onde é normal
que as flores fiquem fragilizadas, mas existe sempre a tentativa de
comercializar esse produto, tendo mais ou menos qualidade.

SR – Em Portugal falta organização do sector?

VA – Talvez. Deveria existir uma entidade que fizesse o controlo de
qualidade do sector da floricultura. Atualmente, a mesma empresa
produz e avalia o seu próprio produto, o que faz com que muitas vezes
não haja muito rigor nessa classificação. Sou da opinião que temos
potencialidade para ultrapassar esse problema e acredito que, pelas
nossas condições climáticas, conseguimos produzir tão bem ou melhor
que os nossos colegas holandeses, desde que haja profissionalização.

SR - A APPPFN pode contribuir para essa profissionalização?

VA - A associação poderia se tivesse capacidade financeira para o
fazer. A APPPFN não tem mais força porque há um espirito muito
individualista, que é algo intrínseco aos portugueses. As empresas não
querem que uma entidade externa classifique as flores e enquanto o
mercado aceitar funcionar assim, não haverá abertura de mentalidades.
Tem de haver uma reorganização baseada numa vontade coletiva e não
numa imposição.

SR - A APPPFN é representativa do sector?

VA - Ainda há muitos produtores que não fazem parte da associação.
Possivelmente, de 400 produtores existentes, nem metade fazem parte da
associação. Há muitos produtores de menor dimensão que não são
associados, embora os maiores estejam representados na APPPFN.

SR – Quais as principais atividades da APPPFN?

VA - Durante muitos anos a APPPFN tentou destacar o sector através da
Lusoflora, uma feira com 25 anos, em Santarém, que infelizmente tem
vindo a morrer e tem muito poucos visitantes. Além disso, participámos
em muitos grupos de trabalho com líderes parlamentares dos diversos
partidos, especialmente quando existiu uma tentativa de sensibilização
para os perigos que a mudança do IVA iria trazer ao sector da
floricultura. Os deputados com quem falámos mostraram-se solidários e
sensíveis mas não apresentaram soluções e agora dizem que o aumento do
IVA de 13 para 23 por cento foi uma imposição da troika. Também
trabalhámos em conjunto com o Gabinete de Planeamento e Políticas do
Ministério da Agricultura e com a Direção Regional que nos tem um
grande apoio para conseguirmos uma caracterização atual do sector, uma
vez que não há quase informação disponível. Algumas das pessoas com
quem falámos pensam que a flor que se comercializa em Portugal é
importada da Holanda e não tem noção que a vinte quilómetros da
Assembleia da República há quase 200 hectares de estufas. Em conjunto
com o INE, estamos também a fazer um novo recenseamento para termos
uma caracterização mais fidedigna do nosso sector, para ganharmos
poder reivindicativo. A associação permite que os produtores ganhem
escala e, por isso, enquanto as pessoas preferirem agir
individualmente é muito complicado. A APPPFN trabalha para o coletivo
e queremos mostrar ao Governo que o nosso sector tem muitos postos de
trabalho porque, feliz ou infelizmente, é impossível mecanizar e a
atividade não exige muita qualificação.

SR – O que aconteceu à Expoflor, que era uma mostra importante do
sector que se realizava aqui no Montijo?

VA – Já não existe porque nas últimas duas feiras que se fizeram o
número de visitantes foi muito baixo. É um evento que cria um certo
impacto porque os nossos produtores permitem ostentação e beleza, mas
existia falta de divulgação. A feira era organizada numa altura com
excedente de produção e por isso dava para fazer inúmeras coisas
devido ao trabalho dos produtores, floristas, decoradores e técnicos.
Para termos alguma produção durante o ano, há dois ou três meses, na
altura da Primavera, em que temos excesso, e por muito barata que a
flor seja, não se consegue escoar, e eram esses produtos que eram
levados e trabalhados na Expoflor.

SR – Considera que a floricultura tem potencial para ser um produto
turístico do Montijo?

VA - Sem dúvida. Atualmente, a Escola Profissional do Montijo quer
criar um roteiro turístico que incluí visitas guiadas semanalmente a
uma adega, a uma produção de flores e a outros locais. Isso poderia
ser uma ideia muito interessante, uma vez que trazia jovens, escolas e
excursões, mostrando o que existe de relevante no Montijo. Não
existindo um roteiro turístico propriamente dito, a Florineve recebe
visitas de universidades, universidades séniores e escolas do ensino
secundário e básico. Quando nos contactam, estamos sempre recetivos a
esse tipo de visitas, mas não as promovemos porque essas iniciativas
têm de ser feitas de forma a não interferir com a nossa atividade
principal, a produção e comercialização de flores de corte. No
entanto, se estas atividades funcionarem num contexto de
complementaridade, acho que seria possível e muito positivo fazer isso
integrado num roteiro turístico.

SR – Para um turista, pode ser interessante visitar uma estufa?

VA - Penso que sim e era um produto facilmente vendável a quem tenha
curiosidade pelo mundo da floricultura. Na Florineve temos mais de 70
variedades de flores, algumas em produção constante, outras em
plantações sazonais. Na parte da comercialização, o que não
produzimos, completamos com importação.

SR - Que destino tem a vossa produção?

VA - A nossa produção é vendida a floristas, revendedores e grandes
superfícies. Não desvalorizando os outros clientes, porque são todos
importantes, as grandes superfícies têm sido muito úteis, porque
funcionam para desmitificar a ideia de que a flor é um produto caro.
Os portugueses procuram comprar flores em datas festivas e nessas
alturas a flor aumenta o preço. Daí existir essa ideia errada, porque
uma pessoa que compra regularmente sabe que isso não é verdade. Não é
um produto de luxo e os supermercados mostram que a flor está ao
alcance de toda a gente, pois há ramos de flores entre 1,99 euros e os
dez euros.

SR - Neste sector não existe a acusação às grandes superfícies de
estas esmagarem as margens de lucro dos produtores?

VA - Uma pessoa que leva um ramo não paga o mesmo que alguém que leva
três mil ramos, e neste caso o custo vai estar espremido. Os
supermercados pressionam, mas só até onde o produtor se deixa apertar.
A opção está sempre do lado dos produtores. Existe alguma pressão com
todos os compradores, mas se os supermercados escoam 40 por cento da
minha produção, vou ter atenção ao preço, e quando não der lucro,
procuro noutros mercados. No nosso sector, se os preços que nos
oferecem não nos permitem ter lucro, procuramos soluções. Claro que,
como temos um timing para vender, entre deitar fora e vender a preços
baixos, devemos adotar a solução mais inteligente.

SR - Qual a dimensão da Florineve neste mercado?

VA - Penso que a Florineve se encontra entre os cinco maiores
produtores de flores de corte a nível nacional. Já estamos há 15 anos
no sector, é uma empresa familiar que tem crescido com muito gosto
pelo que fazemos e com ambição, mas isso só foi possível por nos
rodeámos de bons elementos. Temos um capital humano muito grande nesta
empresa e os colaboradores podem dar opiniões, pois estamos sempre
recetivos a sugestões.

SR - Há trabalho desenvolvido do ponto de vista estratégico na região?

VA - Nem por isso. Um dos objecivos dos produtores do Montijo é criar
um grupo e tentarmos trabalhar juntos. Vai servir para ganhar escala
numa perspetiva de complementaridade. Vamos criar a marca "Flores do
Montijo" para levar mais longe o nome do concelho e o sector da
floricultura. E isso poderá fazer parte de um roteiro de oferta
turística.

www.apppfn.pt
www.florineve.pt

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