segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Como descodificar os prazos de validade da comida

Distribuição disposta a "encontrar soluções" se Governo "flexibilizar
a legislação"


28.10.2012 - 07:59 Por Alexandra Prado Coelho

O fundamental é que se perceba a diferença entre as duas indicações
que aparecem nas etiquetas O fundamental é que se perceba a diferença
entre as duas indicações que aparecem nas etiquetas (Foto: Paulo
Pimenta)

Alimentos fora do prazo de validade não aparecem habitualmente nas
lojas em Portugal, diz a DECO-Proteste. Mas, depois de a Grécia ter
anunciado que os supermercados vão poder vender alimentos não
perecíveis fora do prazo a preços mais baixos, é importante saber que
nem todos os alimentos fora de prazo representam riscos para a saúde.


A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), em
resposta ao PÚBLICO, diz que cumpre rigorosamente a lei, não vendendo
produtos fora do prazo, mas acrescenta que "se o Governo entender
flexibilizar a legislação, garantindo a segurança alimentar, o sector
está disponível para encontrar soluções que ajudem o consumidor nesta
conjuntura tão adversa".

O fundamental, explicou ao PÚBLICO Dulce Ricardo, engenheira alimentar
daquela organização de defesa dos direitos dos consumidores, é que se
perceba a diferença entre as duas indicações que aparecem nas
etiquetas: "consumir até" ou "consumir preferencialmente antes de". No
primeiro caso, o consumo depois da data indicada pode ter riscos para
a saúde. No segundo, pode haver alteração das características dos
alimentos, mas não um risco para a saúde.

No primeiro grupo estão os alimentos perecíveis, como a carne picada,
as salsichas frescas, o queijo fresco, o leite do dia, os bolos com
creme. Aí, diz Dulce Ricardo, "a data deve ser rigorosamente
cumprida", caso contrário corre-se o risco de uma toxinfecção
alimentar. A lei proíbe claramente a venda depois da data indicada, e
se os produtos não forem retirados dos estabelecimentos ficam em
"incumprimento legal". A técnica deixa um aviso: "Um alimento
contaminado pode ter um aspecto perfeitamente normal". A presença de
salmonelas, por exemplo, não é detectável nem pelo aspecto nem pelo
cheiro do alimento.

Lei omissa

Quanto aos alimentos não perecíveis, a decisão cabe sobretudo ao
consumidor. "Se a data indicada em 'consumir preferencialmente antes
de' for ultrapassada pode haver implicações a nível nutricional que
fazem com que o alimento não esteja em condições perfeitas – pode, por
exemplo, ter ranço se for um produto com gordura, ou podem
verificar-se alterações na coloração ou na textura. Nestes casos, "a
lei é omissa", explica a técnica da DECO. "O produto não deve estar à
venda, mas poderá estar".

Em Portugal, não é prática da distribuição pôr alimentos à venda
depois do prazo, quer num caso quer no outro. "Há um respeito por
essas datas", diz Dulce Ricardo. O que pode é haver promoções quando
os produtos estão já próximos do fim do prazo, e o que a DECO
aconselha é que os consumidores estejam atentos às datas nessas
promoções e "não comprem para além da quantidade necessária". As
informações recolhidas pela DECO indicam que em Portugal os
consumidores estão bastante atentos aos prazos de validade e
distinguem entre o "consumir até" e o "consumir preferencialmente
antes de".

A revista da Tetra Pak, que publicou recentemente um número dedicado
ao desperdício de alimentos, cita um estudo da Food Standarts Agency
(FSA) britânica segundo a qual "apenas 36 % das pessoas sabem que os
alimentos cujo prazo de validade expirou podem, na maior parte dos
casos, ser consumidos". Os mais jovens revelam "mais confiança nessas
indicações [das embalagens] do que no seu próprio julgamento e deitam
fora produtos sem primeiro os cheirar ou provar".

Data definida pelo produtor

A data colocada na embalagem é definida pelo produtor. Mas, diz ainda
a revista, "não é incomum que o fabricante coloque uma determinada
data sabendo que o produto se manterá em perfeitas condições de
consumo durante muito mais tempo sem se deteriorar". Isto pode levar a
um enorme desperdício de produtos em bom estado – dados da FAO (a
Agência para a Alimentação e Agricultura das Nações Unidas) indicam
que a quantidade de alimentos desperdiçados na Europa e Estados Unidos
é de 95 a 115 quilos per capita por ano.

Uma medida como a que foi tomada na Grécia (e que abrange apenas os
produtos não perecíveis) seria ou não possível em Portugal? "Não
podemos dizer que há um risco", afirma Dulce Ricardo. Mas a posição da
DECO é a de que o cliente "tem o direito de consumir o produto nas
condições devidas". A organização dos direitos dos consumidores
defende que para estes "é mais vantajoso que o produto seja à partida
colocado à venda a um preço mais baixo", o que permitira um escoamento
mais rápido e evitaria que se chegasse perto dos prazos de validade.
António Salvador Barreto, coordenador do mestrado em Segurança
Alimentar da Universidade Técnica de Lisboa, lembra também que "a
indicação do tempo de vida útil é da responsabilidade do agente
económico", ou seja, do produtor, e que este não está interessado em
correr riscos dando prazos muito alargados. Mas, reconhecendo que em
muitos casos há produtos que se mantêm em boas condições depois do
prazo, Barreto admite a eventualidade de poderem ser usados desde que
sujeitos a supervisão até serem consumidos.

Servir em cantinas?

Isto significa que poderiam ser servidos por exemplo em cantinas (onde
seria possível inspectores sanitários verificarem o seu estado até ao
prato) mas não serem vendidos aos consumidores para que estes os levem
para casa e avaliem, sem terem os conhecimentos técnicos necessários,
as condições desses alimentos.

A FSA britânica disse recentemente que a crise está a fazer com que no
Reino Unido haja cada vez mais pessoas a consumir alimentos passada a
data, correndo riscos para a saúde. Um terço das pessoas ouvidas num
inquérito disse estar a recorrer mais à análise cheiro/aspecto para
decidir se consumia ou não um alimento. Para ajudar nessa decisão, a
FSA tinha já, em Dezembro de 2011, indicado que os ovos podem ser
consumidos até dois dias depois da data da embalagem, "desde que
devidamente cozinhados".

Em Portugal, sublinha ainda a APED, a distribuição tem tomado medidas
para tentar reduzir o desperdício alimentar, investindo "na eficiência
da cadeia de frio, num controlo rigoroso da gestão de stocks e das
validades dos produtos e em técnicas avançadas de conservação".

http://www.publico.pt/Sociedade/como-descodificar-os-prazos-de-validade-da-comida-1569149?all=1

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