segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Terra fértil para abetardas

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14 de Outubro, 2012por Sónia Balasteiro

Companhia agrícola da Apariça tem prejuízo porque desde 2008 só pode
regar 200 dos seus 1.500 ha no Alqueva, para proteger três espécies de
aves.
A Companhia Agrícola da Apariça, proprietária de 2.750 hectares de
terras no perímetro do Alqueva, pondera avançar com um pedido judicial
de indemnização contra o Estado, por este ter inviabilizado o cultivo
da maior parte dos seus terrenos agrícolas.

Em causa, explicou ao SOL o gestor daquela herdade familiar, José
Guedes, está a perda de rendimento associada à protecção de três
espécies de aves em vias de extinção: a abetarda, o sisão e o
francelho, que ali têm o seu habitat natural, e cuja protecção legal
impede que sejam implementados sistemas de rega em 1.500 hectares, «ou
seja, em dois terços da propriedade».

A herdade da Apariça foi uma das duas propriedades da freguesia de S.
Matias, no Baixo Alentejo, a ser integrada na Zona de Protecção
Especial de Cuba, criada pelo Governo em 2008, seguindo directivas da
União Europeia. A questão, diz o proprietário, é que «deveria ser o
Estado a assumir os custos associados à protecção destas aves». «Temos
as terras mais férteis da zona», lamenta.

Desde 2008, quando foram interrompidas as obras que visavam
implementar o regadio para o cultivo de cereais como milho, trigo e
girassol, a herdade está a suportar perdas de cerca de 800 mil euros
por ano, segundo estima o gestor. «Por que tem de ser um privado a
custear a conservação de espécies ambientais e não o Estado?»,
questiona José Guedes.

'Expropriação ao contrário'
«Trata-se de uma expropriação ao contrário», classifica: «Para o
Estado não ser multado por Bruxelas, somos nós a suportar os encargos.
E isso tem como resultado directo a não criação de emprego e perdas no
desenvolvimento económico».

Na prática, a Companhia da Apariça apenas pôde instalar sete pivôs de
rega em cerca de 200 hectares, através de um acordo assinado em 2009
com o então Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade e
com a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), em vigor até
2015. Neste Programa de Gestão Agrícola, estão «salvaguardadas as
condições para a conservação destas espécies estepárias», assinala
Domingos Leitão, da SPEA. «As abetardas, por exemplo, são espécies em
perigo, que precisam de zonas desarborizadas e de sequeiro para
sobreviver», salienta. E acusa: «O que está em questão é que os
mecanismos de compensação agro-ambiental criados pela Comissão
Europeia não estão a funcionar. Não foram desenhados pelo Governo para
a zona do Alqueva».

José Guedes, por seu lado, garante que as abetardas têm «aumentado
precisamente na zona onde foram instalados os pivôs de rega» – diz,
citando um estudo elaborado por técnicos da Companhia, em que se
reporta que foram observados «55 machos em 2011, contra 37 em 2007».

O SOL questionou o Ministério da Agricultura sobre este caso, mas não
foi possível obter respostas.

sonia.balasteiro@sol.pt

http://sol.sapo.pt/inicio/Vida/Interior.aspx?content_id=60974

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