segunda-feira, 11 de março de 2013

Bastará um par de ténis?

Pedro Miguel Santos

Os focos da atenção estão sobre a agricultura e ainda bem!

Isso tem trazido novos interessados ao setor. No âmbito do Proder, já
foram aprovados mais de 7.200 novos projetos de jovens agricultores
(prémio + investimento), aos quais foi atribuído um apoio superior a
460 milhões de euros, alavancando um investimento total acima de 800
milhões. No ano passado, a média foi de aproximadamente 10
candidaturas por dia!

Quem conhece o setor sabe que esta renovação não só é bem-vinda como é
essencial para criar novas dinâmicas e potencialidades.

Alguns números (fonte: www.ceja.eu) mostram, no entanto, que está
muito por fazer, não só em Portugal mas no conjunto dos países
europeus:

6% dos agricultores da Europa tem menos de 35 anos (em Portugal, apenas 2,5 %!)

Mais de 34% dos agricultores europeus têm mais de 65 anos

Nos 27 países europeus, existe apenas 1 agricultor com menos de 35
anos por cada 9 agricultores com mais de 55 anos

Ninguém duvida que a renovação do tecido empresarial agrícola é um
desígnio europeu, e por isso tem existido e continuará a existir um
enquadramento diferenciado para os Jovens que se queiram instalar na
agricultura.

É, por isso, crucial que se desenvolvam ações que contribuam para a
modernização do sector, e que contribuam para aumentar o nível
quantitativo e qualitativo da produção agrícola, sem esquecer a
sustentabilidade financeira das explorações para que os empresários
agrícolas possam viver dignamente da sua atividade. Dessa forma, será
possível tornar o sector mais atrativo, para que mais jovens
empreendedores queiram apostar nele como atividade económica de
futuro.

Mas será que este fluxo impressionante de Jovens Agricultores a
entrarem no setor está associado a projetos de futuro, bem
estruturados e integrados em organizações de comercialização que lhes
permita ganhar competitividade?

Infelizmente, cremos que não!

Quantos potenciais Jovens Agricultores chegam à CONSULAI a perguntar o
que podem fazer para aproveitar "terrenos que têm algures" porque
ouviram dizer que existiam ajudas interessantes para o setor? São
bastantes diariamente, e com formações muito distintas!

Porque nos preocupa bastante a sustentabilidade futura destes
projetos, temos a preocupação de, desde a primeira conversa,
sensibilizar para a realidade de uma atividade económica sujeita a
muitas incertezas e que requer uma prolongada curva de aprendizagem
técnica. Temos a preocupação de lhes transmitir que não basta "comprar
um par de ténis para começar a correr", e que, bem pelo contrário, é
complicado iniciar uma atividade que necessita de elevados
investimentos iniciais e competências técnicas sólidas; é necessário
que, antes de iniciarem esta atividade, os jovens agricultores
percebam que vão tornar-se empresários, com todas as dificuldades e
responsabilidades que isso acarreta.

Como noutras atividades económicas, é necessário garantir um conjunto
de condições iniciais que permitam definir um modelo de negócio sólido
e com futuro. Os jovens agricultores, essenciais para o nosso setor,
devem procurar definir um projeto que tenha como matriz todas as
variáveis "R.E.D.E.":

"R": Recursos - é crucial garantir que os projetos tenham os
necessários recursos humanos, físicos (terra), materiais e
financeiros, que garantam a viabilidade dos projetos; por exemplo, os
recursos financeiros têm de ser dimensionados não apenas para fazer
face ao investimento inicial mas também ao fundo de maneio necessário
para estabilizar a operação (que normalmente é superior ao que se
estima no início)

"E": Experiência - a experiência agrícola é um fator muito relevante
para definir o sucesso dos projetos de instalação. A falta de
experiência de alguns promotores implica que exista um período de
aprendizagem, contrário à necessidade de gerar resultados num curto
período de tempo.

"D": Dimensão - a dimensão crítica das explorações é decisiva para que
se ultrapassem constrangimentos relacionados com a falta de
rentabilidade e que contribuem marcadamente para o abandono da
produção agrícola. Este aspeto só pode ser minimizado com a
organização da produção (via associativismo ou cooperativismo).

"E": Escoamento - a existência de canais de escoamento consistentes é
um aspeto determinante para o sucesso de qualquer projeto de produção
agrícola. Pode parecer estranho, mas este é um aspeto recorrentemente
esquecido por quem quer entrar numa atividade que desconhece.

Todos os novos produtores agrícolas fazem falta e são bem-vindos ao
setor, mas têm de vir preparados, ou têm que se preparar no caminho,
para escreverem uma história de sucesso e ajudar a modernizar a nossa
agricultura. Isso sim, é o que todos queremos!

Pedro Miguel Santos
Director-Geral
CONSULAI, Consultoria Agro-Industrial, Lda

Nota: Este artigo foi publicado na Revista "Vida Rural" de Março de 2013

Publicado em 11/03/2013

http://www.agroportal.pt/a/2013/psantos.htm

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