terça-feira, 16 de abril de 2013

A energia flui do petróleo às renováveis: e você pensa dentro ou fora do barril?

12 Abril 2013, 18:32 por Miguel Prado | miguelprado@negocios.pt
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"O petróleo é a fonte mais versátil que encontrámos até hoje. Não vai
ser fácil desalojá-lo", analisa António Costa Silva. Mas a
descarbonização é "incontornável", diz Jorge Vasconcelos. Saiba o que
pensam alguns dos principais especialistas nacionais sobre o futuro
energético de Portugal.

Portugal tem uma dependência energética do exterior próxima dos 80%.
Entre fontes endógenas e combustíveis fósseis importados, o balanço
nacional é historicamente deficitário, mas desde 2005 que a aposta nas
energias renováveis tem ajudado a desagravar esse registo. O debate em
torno deste tema fluiu, em diversos momentos, para posições
polarizadas. Mas António Costa Silva, presidente da petrolífera
Partex, poderá ser visto como a prova de que um caminho não exclui o
outro.



"Na indústria petrolífera existem dois tipos de pessoas: as que pensam
dentro do barril e as que pensam fora do barril. Eu gosto de pensar
fora do barril", comentou António Costa Silva esta sexta-feira,
arrancando gargalhadas à plateia que assistia à conferência de
lançamento do Simulador 2050, uma ferramenta que a EDP passou a
disponibilizar "online" para permitir ao público em geral entender as
implicações do sector energético nas metas ambientais de longo prazo.



António Costa Silva, sendo um gestor ligado ao petróleo, não deixa de
manifestar, há anos, a sua simpatia para com as energias renováveis.
Mas o presidente da Partex reconhece que a disputa do mercado
energético global entre combustíveis fósseis e fontes renováveis será
intensa. "O petróleo é a fonte mais versátil que encontrámos até hoje.
Não vai ser fácil desalojá-lo", comenta o gestor. "As mudanças
tenderão a ser lentas", acrescenta.



Apesar de os interesses da Partex estarem concentrados essencialmente
no petróleo, António Costa Silva não tem hesitações ao afirmar que "a
electrificação do sistema de transportes mundial vai ser uma das
grandes revoluções do século". António não está só. Outro António, mas
com Mexia no apelido, tem repetidamente sublinhado a sua convicção de
que a economia será cada vez mais eléctrica. "A energia eléctrica está
do lado da solução e não do problema", apontou o presidente da EDP,
notando que "o debate sobre a energia em Portugal tem sido
distorcido".



Para António Mexia, "é preciso que as pessoas saibam quais são as
escolhas e os custos de oportunidade". Foi nesse sentido que a EDP
lançou o Simulador 2050, onde o utilizador poderá fazer as suas
projecções sobre a evolução do consumo no longo prazo, a incorporação
de diferentes opções energéticas renováveis e uma maior ou menor
adesão à mobilidade eléctrica, por exemplo. "A ferramenta é pensada
para ser intuitiva, aberta ao público, mas não deixa de ter alguma
complexidade", explicou Pedro Neves Ferreira, director de planeamento
energético da EDP.



E como não há duas sem três, um terceiro António juntou ao debate a
visão da indústria. António Saraiva, presidente da CIP, considera que
"são inevitáveis acções firmes na área dos transportes e da
construção", para promover a eficiência energética em Portugal.
Admitindo que "a aposta nas renováveis é boa", o líder da confederação
patronal não deixa de manifestar o desconforto com os sobrecustos de
algumas destas fontes. "Deseja-se que a energia eólica entre
rapidamente no regime de preços de mercado", refere António Saraiva. E
o nuclear? Sem tabus. "Não se deve descartar a opção nuclear no bloco
ibérico", sugere.



Para diversos especialistas, Portugal não tem um consumo eléctrico que
justifique a escala de um investimento numa central nuclear. Sobretudo
num momento como o actual, em que a economia está em retracção e a
aposta feita na última década em nova capacidade renovável criou um
parque electroprodutor mais que suficiente para responder à procura
projectada até 2020.



"Isto tem a ver com políticas públicas"



Sem restringir o debate à produção de electricidade, que representa
sensivelmente um quarto de toda a energia consumida em Portugal (o
restante vem, sobretudo, do mercado de produtos petrolíferos), Jorge
Vasconcelos, o antigo presidente da ERSE, chama a atenção: "quando
falamos de descarbonização da economia isto não significa só
electricidade, tem a ver com políticas públicas".



Agora consultor na área da energia, através da empresa New Energy
Solutions, Jorge Vasconcelos acredita que "descarbonizar os
transportes é incontornável", quer pela adopção de motores mais
eficientes no consumo dos combustíveis, quer pela electrificação do
parque automóvel.



Mas Jorge Vasconcelos vai mais longe. Reconhecendo o trabalho feito
por Portugal no domínio das energias renováveis, algumas
multinacionais, como as de "data centers", poderão ver no nosso país
uma localização interessante para se instalarem, adquirindo
"electricidade verde" e pondo essa etiqueta nos seus relatórios de
sustentabilidade. "Temos boas condições em Portugal para atrair a
grande indústria", declara o antigo regulador da energia.



Nuno Lacasta, presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA),
observa ainda a importância do desenvolvimento de tecnologias de
captura e armazenamento de carbono (CCS, na sigla em inglês). "No
horizonte de 2050, creio que para certos sectores da indústria será
central a integração da lógica de CCS", comenta Lacasta.



O planeamento energético de longo prazo está na base da tomada de
decisões de investimento nas tecnologias de amanhã. No entanto, pensar
num horizonte de décadas apresenta desafios. Mesmo os planos traçados
pelo Governo português até 2020 têm uma dose considerável de
incerteza, conforme assume o secretário de Estado da Energia.



"Hoje em dia não é fácil desenhar políticas energéticas e de
sustentabilidade ambiental. As opções são muitas e as variáveis
políticas e económicas também são muitas e mudam constantemente",
analisa Artur Trindade. E como "todas as opções energéticas são
intensivas em capital", acrescenta o secretário de Estado, cabe ao
Governo criar um enquadramento regulatório "estável e atractivo", para
que as empresas possam tomar as suas decisões de investimento.



Uma factura energética de 7 mil milhões de euros



O debate sobre a transição para uma economia de baixo carbono (a meta
da União Europeia é que até 2050 os países reduzam as emissões de CO2
em 80% face aos níveis de 1990) está longe de produzir consensos.
Ainda assim, António Mexia destaca que "a descarbonização da economia
tem de ser vista como uma oportunidade", quer pela geração de emprego,
quer pelo estímulo à investigação nas universidades.



Os dados da Direcção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) mostram que a
dependência energética portuguesa tem vindo a diminuir. Em 2005
rondava os 89%. Em 2011 estava nos 77%. Neste ano o petróleo valia
53,8% da energia final consumida em Portugal, a electricidade 26,9%, o
gás natural 9,5% e a biomassa 8,5%.



Apesar da aposta feita nas fontes renováveis, com maior expressão no
sector eléctrico, Portugal não evitou um agravamento da sua factura
energética global, que em 2011 se traduziu num saldo importador de 7,1
mil milhões de euros, mais 27,7% do que em 2010. Tratou-se do segundo
maior valor em seis anos, apenas abaixo da factura de 2008, ano
marcado pela escalada histórica da cotação do petróleo.



Embora o recurso a energias amigas do ambiente permita a Portugal, e
aos outros países, cumprir as metas assumidas em prol do combate ao
aquecimento global, os caminhos para lá chegar não estão livres de
obstáculos.



No domínio da produção de electricidade, a geração térmica (a carvão
ou a gás natural) apresenta-se ainda com custos mais competitivos do
que os das tarifas garantidas às diversas fontes renováveis. Do seu
lado, as "energias verdes" têm um progresso tecnológico que em alguns
casos já trouxe a paridade de rede, isto é, a capacidade de concorrer
na venda da energia em mercado, sem necessidade de subsídios. No
entanto, a intermitência de recursos como o vento e o sol torna
necessária a continuidade de soluções fiáveis, entre as quais as
centrais termoeléctricas.



Por outro lado, no consumo de combustíveis rodoviários as metas
europeias para 2020 prevêem a incorporação de 10% de fontes limpas,
mas a inclusão de biocombustíveis tem como contrapartida o
encarecimento do custo do produto para os consumidores.



O debate dificilmente convencerá toda a sociedade quanto aos caminhos
a seguir. Mas para António Mexia é "inquestionável" a necessidade de
pôr a informação na praça pública. "A EDP gosta desta discussão
transparente, clara", assegura o gestor.

http://www.jornaldenegocios.pt/empresas/detalhe/a_energia_flui_do_petroleo_as_renovaveis_e_voce_pensa_dentro_ou_fora_do_barril.html

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