terça-feira, 18 de junho de 2013

Inspeções da ASAE levam 1915 à prisão

GRANDE INVESTIGAÇÃO - SEGURANÇA ALIMENTAR



por Sílvia FrechesHoje23 comentários

Desde que foi criada, em 2006, a Autoridade de Segurança Alimentar e
Económica já enviou para os tribunais 3477 processos-crime. Só nos
primeiros três meses deste ano, nas 1885 inspeções realizadas foram
detidas 164 pessoas e encerrados 319 estabelecimentos

Vinte cinco mil operações, 45 mil brigadas, 126 mil operadores
inspecionados, 34,4 milhões de euros de mercadoria apreendida... Os
números, por si só, "denunciam" o seu responsável: Autoridade da
Segurança Alimentar e Económica, ASAE.

Segundo o relatório a que o DN teve acesso, só na área alimentar,
desde que começou a atuar em 2006 e até março do corrente ano, esta
entidade fiscalizadora já deteve 1915 pessoas. Um número que
representa 29,5% das detenções totais da ASAE (6503). Nos primeiros
três meses deste ano já foram levadas ao juiz 164 pessoas que
manuseiam alimentos. Esta é, sem dúvida, uma taxa elevada quando
comparado com 2012: em 12 meses houve 283 detenções.

O abate ilegal, a venda de produtos estragados e a fraude sobre
mercadorias estão na base da maioria das detenções efetuadas pela
ASAE, que tem competência para deter quando existe flagrante delito.
Uma das mais importantes ações aconteceu numa exploração em Sines,
onde era feito o abate ilegal para consumo humano. O local funcionava
como um minimatadouro e teve uma vigilância apertada da ASAE durante
algum tempo, até que as suas brigadas avançaram para o terreno numa
altura em que se procedia ao abate de ovinos e caprinos. Sete pessoas
foram detidas e acabaram por ser condenadas com penas de prisão,
convertidas em multa. Foi apreendida a mercadoria constituída por
animais vivos e outros já abatidos. "Esta foi uma das operações mais
marcantes da ASAE", como admitiu ao DN Filipe Meirinho, diretor de
operações da entidade, que conta com cerca de 260 inspetores e que por
mês têm que realizar pelo menos 600 operações.

No balanço da atividade acumulada (até março de 2013), em todos os
campos de atuação, a ASAE realizou 51997 operações, 48% das quais na
área alimentar. O número de infrações detetadas ascendem a 113 mil e
mais de metade (64565) são provenientes da alimentação (57%). Na
sequência dessas ações foram instaurados 13536 processos crime, 25,6%
(3477) alimentares. Já do total (8049) dos estabelecimentos
encerrados, 6641(82,5%) foram operadores que lidam com alimentos .

"Numa altura destas de crise profunda a ASAE só ajuda a agravar mais
as dificuldades financeiras dos comerciantes", desabafou ao DN um
responsável de um operador que recusou identificar-se e que diz
receber quase todos os meses a visita de uma brigada .

O abuso de poder é, aliás, uma das críticas frequentes dirigidas à
ASAE ao longo dos anos. E a mais "forte" terá sido a do então líder do
PSD/Algarve, Mendes Bota, que, em 2008, comparou a ASAE à PIDE,
acusando aquele organismo de perseguir os cidadãos. Filipe Meirinho
sorri e desvaloriza: "As pessoas olham para a ASAE como amiga do
consumidor. Há um estudo que colocava a ASAE com um nível de
popularidade acima de qualquer político nacional. Quando os nossos
inspetores estão no terreno quase sempre são bem recebidos. Apenas me
recordo de uma situação há uns tempos em que um inspetor nosso foi
violentamente sovado, mas foi a única situação." E o diretor de
inspeções reforça essa opinião relatando um episódio. "Tenho um amigo
que um dia me disse: "Ainda bem que existe a ASAE. Antes, quando ia ao
restaurante, chegava à casa de banho pelo cheiro, agora tenho de
perguntar onde é.""

Ana Isabel Trigo Morais , diretora geral da Associação Portuguesa de
Empresas de Distribuição (APED), que tem como associados a maioria dos
grandes operadores, não fala em abuso de autoridade, mas alerta para a
necessidade da ASAE usar o seu poder da mesma forma com todos os
operadores. "Os consumidores necessitam que o País tenha a sua
autoridade fiscalizadora. Nós também apoiamos que haja uma entidade
fiscalizadora forte. Somos dos sectores mais cumpridores, é natural e
desejável que a ASAE também cumpra, mas é necessário que fiscalizem
todos os operadores económicos e que haja uma atitude pedagógica. Não
é só fiscalizar, apreender e multar, é necessário ir ao terreno e ter
um caráter de pedagogia."

Filipe Meirinho explica que os grandes hipermercados têm mais
intervenções devido ao seu volume de transações, que exige que tenham
um maior controlo. "Não temos nada contra", afirma, salientando que o
tratamento é igual para todos e que a ASAE não sofre pressões. "Não
fechamos a cantina da Assembleia da República? Fui eu que mandatei. Os
dois inspetores chegaram ao local, suspenderam a atividade do bar da
AR e saíram. Passados dois dias foram chamados para reabrir o local.
Reabriu e eu era um inspetor-chefe e o diretor-geral não me disse
nada. Foi tratado como um caso normal."

O número de infrações na área alimentar tem decrescido ao longo dos
anos. Recuando a 2007 (o primeiro ano completo de atividade da ASAE)
foram detetadas 15 514 infrações, mais cerca de 5 mil do que no ano
seguinte e mais seis mil do que em 2009. A este nível, 2012 foi o que
registou o menor número de infrações, 6811. Uma situação que, segundo
Meirinho, se justifica pelo facto de os operadores terem percebido ao
longo dos anos que isto da "segurança alimentar é para levar mesmo a
sério" e elogia: "a grande maioria, agora cumpre com as normas".

Entre as apreensões - que vão desde produtos com identificação errada
ou informação fraudulenta, fora de prazo, guardados ou expostos em
locais sem condições de higiene - a ASAE regista um total (em todas as
áreas) de 21,6 milhões de produtos, 8,9 milhões dos quais alimentares
(41%). "A maioria desses produtos são distribuídos por entidades de
solidariedade social", garante Meirinho. Falando de euros, as
apreensões totais têm o valor de 155,3 milhões, com os produtos
alimentares a "contribuírem" com 34,4 milhões de euros.

http://www.dn.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=3270247&page=-1

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