domingo, 24 de agosto de 2014

Brasil aproveita oportunidade aberta pelas sanções russas


JOÃO PEDRO PEREIRA 24/08/2014 - 07:38
Outros países da América Latina e também a Turquia estão a posicionar-se para virem a ser vencedores na guerra económica em curso entre a Rússia e o Ocidente.

 
A necessidade de a Rússia encontrar fornecedores de carne e cereais está a alimentar expectativas de um aumento das exportações brasileiras para aquele mercado, após anos em que as relações comerciais entre os dois países sofreram um arrefecimento.

Logo a 7 de Agosto – dia em que o governo russo anunciou que o país deixaria de importar carne, peixe, vegetais, fruta e lacticínios dos EUA, União Europeia, Noruega, Austrália e Canadá –, o ministro da agricultura da Rússia, Nikolai Fyodorov, adiantou que as restrições seriam compensadas por compras de carne ao Brasil e a outros países da América Latina, entre os quais o Chile, a Argentina e o Equador. 

Naquele mesmo dia, o governo brasileiro anunciou que 90 fábricas de carne tinham acabado de receber autorização para exportar para o mercado russo. O secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Seneri Paulodo, afirmou na altura que se abria "uma grande janela para o Brasil". 

Aquela não foi uma medida de última hora. "As negociações para ampliar a relação comercial com a Rússia já estavam em andamento há mais de seis meses", explica ao PÚBLICO o secretário para as Relações Internacionais daquele ministério, Marcelo Junqueira.

Na sequência das sanções, a Comissão Europeia fez saber que faria pressão junto dos países da América Latina para que se solidarizassem com a posição ocidental, mas a estratégia não parece estar a dar frutos, nem no Brasil, nem nos restantes países. "Estamos preparados para atender à crescente procura mundial, sem preferência por este ou aquele cliente", assegura Junqueira.

Enquanto o Brasil aumenta a exportação de carne e espera fazer o mesmo com cereais, outros países da América Latina tentam também intensificar as relações comerciais que já têm com a Rússia.

Entre os produtos embargados por Moscovo, o Chile já vende à Rússia peixe, frutas e carne de porco, ao passo que a Argentina exporta fruta, carne de vaca e queijo. Do Equador são enviados café, bananas e chá. Os contactos com estes países foram rapidamente postos em curso pela diplomacia russa e estão a ter consequências. Esta semana, 12 empresas de peixe chilenas receberam autorizações para exportar.

Relações aquecem
O estreitar de relações entre o Brasil e a Rússia surge após um período em que as trocas comerciais caíram. "Apesar de o Brasil e a Rússia integrarem o grupo dos BRICS [Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul], o comércio entre os dois países tem perdido dinamismo nos últimos anos", nota o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil, Fábio Faria. Em 2010, a Rússia era o décimo principal destino das exportações brasileiras. Em 2013, tinha caído para a vigésima posição.

Porém, mesmo antes das sanções, já 2014 estava a ser um ano de inversão da tendência. Até Julho, as exportações brasileiras para a Rússia cresceram 25% face ao mesmo período do ano passado, em parte impulsionadas por uma subida na venda de carne. "Há uma expectativa favorável de ampliação das vendas, especialmente dos produtos agrícolas, o que é bom, sobretudo num momento de retracção das exportações", diz Fábio Faria.

Já Marcelo de Paiva Abreu, professor de Economia na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, nota que as relações anteriores entre Moscovo e Brasília eram "bastante ténues". O académico argumenta que "a deterioração das relações políticas e económicas da Europa e dos EUA com a Rússia certamente abre espaço para maior aproximação, e contribui para dar substância ao bloco dos BRICS". 

Fora da América Latina, a Turquia – candidata desde 1999 a membro da União Europeia – é outro dos países a querer aproveitar a oportunidade. "A Turquia é um grande fornecedor de alimentos e produtos agrícolas à Rússia. Estamos prontos para aumentar as exportações alimentares para a Rússia, se necessário", afirmou o ministro da Economia turco, Nihat Zeybekc, dias após o anúncio de Moscovo. No ano passado, a Rússia representou 7% das exportações alimentares turcas, segundo dados compilados pela ONU. 

Sem comentários:

Enviar um comentário