segunda-feira, 23 de março de 2015

Todos podemos ser agricultores?



 10 Março 2015, terça-feira  João DuarteBarbosa Política Agrícola

A imagem veiculada dá-nos a ideia de que o futuro de quem aposta na agricultura é (e será) risonho, que a agricultura é para todos, quando, na realidade, não o é.
Nos últimos anos, tem-se assistido a um crescente interesse pela produção agrícola em Portugal, deixando de ser visto como o parente pobre dos 3 Setores Económicos (como o era na altura da adesão à UE, onde existia um inexplicável sentimento de vergonha por sermos um país com produção agrícola) para passar a ser visto como o El Dorado da rentabilidade empresarial. Uma das fileiras desta nova geração de agricultores tem visto na produção dos chamados pequenos frutos o ex-líbris desta "febre", com o mirtilo como expoente máximo desta nova forma de se "ganhar muito dinheiro". Mas o aumento súbito do interesse nesta fileira do setor agrícola não aparece apenas pela "larga margem de crescimento" e pelo "potencial económico dos pequenos frutos", que de facto o têm, mas também por ser um cultivo "fácil", com retornos do investimento mais "imediatos" do que os obtidos em outras fileiras do setor, o que já não será bem desta forma.
Esta nova onda tem sido também sustentada pelos apoios à instalação de jovens agricultores, que chegam a apoiar até 80% do valor do investimento inicial. Porém, toda esta conjuntura aparentemente favorável - e partindo do principio que assim o é - implica sempre um conhecimento bastante profundo das ciências agrárias e do(s) produto(s), para que se consigam máximos de produtividade e rentabilidade, existindo também fatores externos que poderão determinar de forma crucial o sucesso da exploração.
Porém, na opinião pública, a imagem veiculada dá-nos a ideia de que o futuro de quem aposta na agricultura é (e será) risonho, que a agricultura é para todos, quando, na realidade, não o é.
É premente informar o putativo agricultor dos riscos que este está a correr e que, apesar de todas as ajudas ao investimento, se ele fracassar, irá, garantidamente, perder dinheiro. Para além do tempo investido: se o objetivo de se produzir um produto agrícola é gerar rentabilidade suficiente, não é possível fazê-lo em part-time. Em alguns casos, serão precisos dois "full-times". É intrigante o facto de ainda não conseguirmos saber o que está a acontecer a muitos dos projetos que arrancaram, mesmo depois do primeiro Programa de ajudas (PRODER 2007-2013) já estar concluído: surpreendentemente (ou não), o Governo ainda não publicou até à data nenhuma estatística relativa ao número de desistências/falências/sucessos de projetos que avançaram nestes últimos anos. Estes dados seriam uma boa ferramenta de auxílio para os novos interessados, não só para se conscientizarem acerca dos riscos, mas também para ajudar a perceber o que falhou em projetos anteriores, de forma a ajudar quem agora se inicia.
Antes de o potencial agricultor pensar no retorno económico que este negócio lhe poderá trazer, deverá sim informar-se a fundo, nas mais variadas fontes mas, principalmente, junto das mais importantes: de outros produtores, que lhes poderão contar acerca da suas experiências e o que implica, na realidade, ser agricultor.
Existem, garantidamente, excelentes oportunidades de investimento e de criação do próprio emprego no setor agrícola, mas estas sorrirão apenas para alguns, não para todos.

1 comentário:

Anónimo disse...

Toda a razão ás conclusões a que chegou.
Mas há outras razões que mexem com o tema, sendo elas a capacidade da terra obter produções cada vez maiores e mais qualificadas. A essas especializações nem todos chegam, mas não deixam de ser elas que virão a condicionar o sucesso de quem se auto consagre agricultor de gema, de profissão , de tradição etc.
Há que levar em conta que o excesso de produção existe como potencial e é o pior inimigo dos todos que querem ser agricultores á toa . Acrescente-se que o limite do que se produz é o equilíbrio do que se usa e consome. Acima disso, estraga-se e adeus economia.
O planeamento confina os potenciais agricultores no limite do consumo e é somente isso que deve ser tido em conta especialmente pelos responsáveis que se eximem de responsabilidades sobre aquilo que provavelmente desconhecem.
Naturalmente, o ajuste faz-se pela falência dos menos experimentados e pelo sucesso dos mais trabalhadores inteligentes.
Pena que a filtragem de quem é quem, fique por conta de artimanhas e vícios acumulados em detrimento do sofrimento que a população consumidora suporta.
Planejem a agricultura e façam seus consumidores felizes.

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