quinta-feira, 9 de abril de 2015

Monsanto. A “semente do Diabo” que controla os transgénicos do mundo



Tem o monopólio da produção transgénica em todo o mundo e resiste a todos os ataques. O segredo? A bênção do governo americano
O apresentador da HBO Bill Maher deu-lhe o nome de "semente do Diabo", a revista "Fortune" identifica-a como "a corporação mais temida da América" e, em 2013, os leitores da revista "Natural News" elegeram a empresa como a mais perigosa do ano. As acusações sucedem--se, assim como as manifestações contra o seu trabalho e os estudos sobre a qualidade dos seus produtos. Contrariando a onda negativa que a cerca, a Monsanto mantém-se líder de mercado no que toca aos transgénicos e, o ano passado, registou lucros de 1,6 mil milhões de dólares.
 
As contradições não se ficam por aqui. Ao mesmo tempo que financia a educação de crianças nas aldeias do Vietname e é considerada uma das empresa que mais promovem a igualdade LGBT, conta com protestos a nível mundial ou denúncias que envolvem a suspeita de publicação de dados falsos sobre os seus produtos e ameaças aos agricultores. Mas antes de entrar no debate ético sobre a agricultura transgénica, vamos aos números. A Monsanto tem 404 instalações em 66 países, das quais 146 estão espalhadas por 33 estados americanos. Emprega 21 183 funcionários a nível mundial, 10 277 dos quais nos EUA. Tem mais de 1676 patentes sobre sementes, plantas e outras aplicações agrícolas e controla mais de 90% das sementes transgénicas vendidas em todo o mundo.
 
Apesar de estar presente em quase todo o mundo e de os alimentos geneticamente modificados estarem nas prateleiras dos supermercados há mais de duas décadas, as incertezas sobre as consequências para a saúde ainda inquietam muita gente. A Monsanto assegura que todos os produtos são testados e só são comercializados quando se prova que não afectam a saúde, mas a resposta não convence as organizações ambientais e a comunidade científica.
 
Jeffrey Smith, director do Instituto de Responsabilidade Tecnológica dos EUA, garante que as análises feitas em animais alimentados por produtos geneticamente modificados mostram que houve problemas intestinais, baixa imunidade, baixo nível de reprodução, morte prematura e desenvolvimento de tumores. "Os estudos mais recentes estão a causar medo entre os norte-americanos", conta ao i o investigador. Nos Estados Unidos, 40% das pessoas dizem que estão a evitar alimentos transgénicos, mas a maioria fica confusa ao escolher os produtos. O especialista explica que, apesar de a rotulagem a indicar processamento de alimentos não ser obrigatória, algumas empresas estão, de forma voluntária, a dar essa informação. "Em apenas um ano, os produtos que se dizem livres de modificação genética tiveram um aumento substancial de vendas", conta, alimentando a esperança de "pôr um fim" ao império de empresas como a Monsanto. "Os consumidores estão a rejeitar este tipo de produtos e vão obrigar as empresas a mudar o seu tipo de produção."
 
Herbicidas Mais céptica quanto ao fim da Monsanto é a bióloga Margarida Silva, que prevê "um futuro brilhante" para a multinacional. "A Monsanto retira 30% dos lucros da venda do herbicida e pelo menos mais 30% da venda de sementes resistentes ao herbicida", explica ao i, recordando a mais recente polémica em que a empresa se viu envolvida. As análises feitas ao glifosato, um dos herbicidas mais vendidos do mundo – e o mais vendido em Portugal – indicam que o produto possa ser um "carcinogéneo provável para o ser humano", informação já negada pela empresa. A discussão ficou à espera de mais dados, assim como o Ministério do Ambiente português que revelou, a semana passada, que irá aguardar as autoridades europeias para decidir sobre a segurança dos glifosatos, o herbicida mais vendido em Portugal – cerca de 64% do total. "A prova de que este herbicida provoca cancro seria o suficiente para levar à implosão da Monsanto, e por isso a empresa vai influenciar os dados, como já fez anteriormente", acusa Margarida Silva, autora do livro "Alimentos Transgénicos, Um Guia para Consumidores Cautelosos".
 
Com produções geneticamente modificadas, a Monsanto junta ao controlo da produção alimentar o monopólio dos herbicidas usados para matar as ervas daninhas. O problema surge quando, ao longo de décadas de uso em grande escala, essas ervas se tornam resistentes aos produtos nocivos. "Os agricultores passaram a ter de usar doses gigantescas de herbicidas, ao ponto de a Monsanto financiar os seus agricultores para que possam comprar outro tipo de herbicidas, alguns até da concorrência", denuncia a bióloga. Só nos Estados Unidos, calcula-se que apareceram cerca de 130 plantas daninhas resistentes a herbicidas em 4,45 milhões de hectares de culturas.
 
Monopólio Ultrapassando todas as forças que se unem contra o seu poder, a Monsanto resiste no tempo, mais precisamente desde 1901, ano da sua fundação. Longe vão os tempos em que a sacarina era o seu produto principal, que vendia à indústria alimentar e à Coca-Cola em particular. Ao acompanhar a industrialização, especializou-se na produção de ácido sulfúrico, plásticos e químicos agrícolas. O apoio governamental foi essencial para o seu crescimento mais recente e as ligações entre a empresa e a administração dos EUA tornam-se difíceis de esconder. Os membros da direcção da Monsanto têm ocupado lugares na Protecção Ambiental Americana (EPA) e na assessoria do Departamento de Agricultura do governo. A Wikileaks deu mais golpe ao divulgar 900 mensagens que mostraram como o governo norte-americano gastou dinheiros públicos para promover a Monsanto e levar os transgénicos a vários outros países.

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