sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Olh’ó chícharo de Alvaiázere


     
Pedro d´Anunciação Pedro d´Anunciação | 27/08/2015 22:14 625 Visitas   

O chícharo, ainda pouco conhecido mas apreciadíssimo por quem o prova, é uma leguminosa (como as ervilhas e as favas), cuja semelhança anda entre o grão-de-bico e os tremoços, muito rica em proteínas, hidratos de carbono e sais minerais, sem gordura (como convém aos tempos). Cultiva-se normalmente de forma intercalar, entre oliveiras, figueiras e outras árvores de produção, aparecendo também associada ao cultivo do grão-de-bico – pedindo terrenos áridos e não exigindo manutenção ou acompanhamento enquanto se desenvolve na terra.

Foi sinónimo de pobreza – era 'a carne dos pobres' –, mas tem sido recuperado como produto tradicional. Sem exigências de amanho nem terrenos, cresce em qualquer quintal. A recompensa que oferece este chícharo é um paladar requintado e a polivalência de ser usado para pão, doces, sopas, guisados, purés...
A zona da sua produção é fundamentalmente Alvaiázere, uma vila de Leiria, e tem extremas em Ansião, Figueiró dos Vinhos, Ferreira do Zêzere, Ourém e Pombal.

O nome parece vir do latim, Cícer; os romanos denominavam-no de 'círcula'. De origem discutível, é dado como seguro o aparecimento no Mediterrâneo Oriental: Grécia, Turquia e Síria. Daí se expandiu, com relativa rapidez, pelo mundo habitado. Há para alimentação humana na Ásia, África Oriental e países mediterrânicos da Europa. É usado há quatro mil anos na Índia.

O consumo contínuo pode produzir uma intoxicação denominada 'latirismo', que afecta tanto homem como animais. Caracteriza-se esta intoxicação por tremores, paraplegia e parestesias. E surgiu com intensidade em Espanha, durante a grande fome que se seguiu à guerra civil de 1936-39.

Parece assente que entrou em Portugal pelo SuI, sendo trazido para as Beiras pelas populações nos seus movimentos sazonais. Foi sempre sinónimo de pobreza, considerado a 'carne dos pobres'. Teve um papel importante na alimentação nos anos 30 e 40, sobretudo no SuI do país e nas Beiras. Servia também de alimento a rebanhos de gado bovino e caprino.

Está agora a ser recuperado a partir da região de Alvaiázere, como produto tradicional, e é cada vez mais usado nas gastronomias de todo o país. Os jovens não são ainda muito adeptos, mas para lá se pretende caminhar (havendo até programas intensivos nesse sentido, por instituições turísticas e ligadas à gastronomia tradicional).

Cozido, em fresco ou seco, é a forma mais garantida de o comer. O paladar considera-se requintado e agradável. Mas os Festivais de Alvaiázere (aí por Junho) pretendem ir avançando com receitas diversas, desde o pão (há uma padaria local que o vende, diz-se que agridoce e de sabor muito suave, perfeito para sanduíches e não só) e do puré ao chocolate, bombons e queques, passando por doces e licores (ver texto em cima). E há sopas, guisados, saladas, pudins, crepes, enfim, todo um mundo de iguarias.

Como não tem exigências de terrenos nem de amanho, o leitor pode experimentar em qualquer quintal a que tenha acesso, mesmo entre árvores e outras culturas. Se não gostar do resultado, tem fama de funcionar como óptimo adubo.

E, embora se cultive e use bastante noutros locais de Leiria (Santa Catarina da Serra também lhe dedica um Festival), Alvaiázere é efectivamente a sua capital.

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